Era o verde.  Era o sereno. Era o anti-lógico. Destruíram um estacionamento para a construção de uma praça. Nos três primeiros dias foram emitidos dezessete procurações e doze mandatos de prisão. O mundo estava atrás de alguém que fosse cruel o suficiente para pensar em salvá-lo dele mesmo. Em seu apartamento o herói condenado chorava em silêncio, pois foi visitar a praça recém construída e não achou um lugar para estacionar. Arrependimento. Era assim, cada um tem a cruz que merece.  A dele era o ódio de uma sociedade automobilizada. Teve de se manter anônimo. Esperou por quatro meses em uma rotina básica de todo cidadão. Vestiu sua farda, pegou suas ferramentas e fez o mesmo com outros dois estacionamentos. Era uma quarta-feira, 16 de abril. Virou feriado após o primeiro ano. Batizaram esse dia de Orgulho Neoecopósdesconstrucionista. Devem ter escolhido esse nome para que não se lembrem dele. Lembro que ocorreu um plebiscito para a escolha do nome desse feriado. Dia da Vergonha e Dia do Safado que Age às Escuras perderam por pouco.
 Alguns moradores da cidade montaram uma religião que venera as praças e a salvação do mundo através do nudismo. A maioria desses devotos foram para o hospital psiquiátrico dois meses depois. Alguns vizinhos das novas praças começaram a sentir fortes dores de cabeças. Especialistas dizem que foi o oxigênio que causou essa dor. O último surto de suicídios ocorreu em agosto. Trinta e seis pessoas se suicidaram em duas semanas. O líder dessa vanguarda, Les Alexander, disse em sua carta de despedida: “... e por meio dessa carta, venho relatar que estou sendo a resistência da humanidade. Não queremos um messias, não queremos ser salvos para herdar os ossos dos que não forem.” Entre os suicidas estava o nome de Srta. Prigel, ex-mulher de nosso herói anônimo.
Bang.
Um tiro entre seus olhos. O herói ficou uma semana sem sair de casa e duas com a náusea que tinha do espelho. Assassino. Sua ex-mulher morta pelas suas ideologias. Morta pela sua ânsia de ficar famoso. Depois da náusea veio a felicidade de ver a carcaça de alguém que já lhe causara tanto sofrimento. Com isso percebeu que quanto mais estacionamentos ele transformava em praças, mais ele era odiado e mais pessoas se suicidavam. Era essa sua grande missão.  A salvação nada mais era do que a própria condenação. Fadado à miséria. Seria o herói. Seria o vilão. Se houvessem mais papéis ele também seria a donzela em perigo, o assistente gago, o escravo eunuco e o aleijado que o trai por uma prótese. Mas não haviam. O monstro-herói se preparava para mais um dia de sua própria guerra mundial. Parou em frente de sua casa com suas ferramentas na mão. Estacionamentos? Não. Não hoje. Hoje era um dia especial. Mirou a coluna de sustentação. Usou seu martelo como se fosse um aríete. Como a genitália de um estuprador penetrando sua vítima. Viu os escombros de sua casa ao chão. Após isso, adotou a vida social de uma medusa.  Fechou-se para o mundo que não o compreendia. Não era mais bem vindo. Libertou-se de seus bens pela salvação/condenação. Dizem que uma vez por ano ele toma água de coco com os nudistas. E que os nudistas não apreciam sua companhia. E que eles morreriam para saber quem é o messias das praças. Mas não o fazem. Pois o herói optou pelo anonimato. E assim viveu. E viveu. E não morreu.